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MULTIPROPRIEDADE

  • Renato Cunha
  • 14 de nov. de 2018
  • 21 min de leitura

O Projeto de Lei do Senado, nº 54/17, encaminhado à revisão da Câmara dos Deputados, em maio/18, agora como PL nº 10287/18, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), nesta quarta-feira (31/10/2018), e regulamenta o regime de multipropriedade de imóveis, nova modalidade de condomínio, alterando o Código Civil (Lei 10.406/02). O projeto foi analisado em caráter conclusivo e poderá seguir diretamente para sanção presidencial, a não ser que haja recurso para votação pelo Plenário.

Este assunto desperta meu interesse a mais de 10 anos. Estudei, pesquisei, coletei informações e avaliei as possibilidades comerciais e juridicas de sua implementação.

Mas os obstáculos eram muitos, alguns deles instransponíveis e sem que houvesse uma Lei específica que legalizasse a multipropriedade imobiliária por fração de tempo de uso, os muitos conflitos e lacunas só apontavam ao insucesso desta sistemática. Agora, com alguns cuidados jurídicos adicionais, definições principiológicos e controles administrativos, será possível e de grande probabilidade de êxito. Esta Lei torna viável, lucrativa e conveniente a implantação de Multipropriedade Imobiliária.

Um imóvel, com vários proprietários de unidades de tempo (mínimo de 7 dias por ano), compartilham em regime condominial e dividem os custos de aquisição e manutenção.

Cada multiproprietário paga as taxas normais de moradia, como água, luz, IPTU e condomínio, conforme o seu tempo de permanência no imóvel, através de documento individualizado pertinente ao uso de cada multiproprietário.

O coproprietário, com registro de propriedade no cartório de imóveis, pode alugar o imóvel durante a sua fração de tempo e até mesmo vender a sua parte de tempo, desfazendo-se do bem sem anuência dos demais coproprietários.

A convenção de condomínio da unidade determinará os poderes e deveres dos multiproprietários, o número máximo de pessoas que podem ocupar simultaneamente o imóvel, a criação de fundo de reserva para reposição e manutenção de instalações e mobiliário, além das multas aplicáveis a quem não cumprir com suas obrigações.

Estes são apenas alguns dos princípios básicos do futuro da MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA brasileira, conceito ainda novo no Brasil, e que agora serão comentados, incluindo suas diversas implicações práticas e legais, conforme texto final divulgado pelo CCJ da Câmara dos Deputados para sanção presidencial.

Meus comentários e observações não pretendem esgotar o assunto pelo seu ineditismo e ausência de casos práticos com seus eventuais erros e acertos. Certo é que a ausência de regras muito claras, controles rigorosos e proprietários totalmente engajados no espírito do timeshare, a médio e longo prazo isto poderá se tornar fonte de conflitos.

Aguardemos então a sanção do projeto em Lei, mas não sem comentarmos aspectos que ainda dispertam minham curiosidade e aguçam meu senso de oportunidade empresarial pela complexidade exigida destas relações jurídicas e para as quais me preparei por anos a fio.

Classifica-se a multipropriedade em quatro modalidades distintas, sendo a primeira que segue o nosso único real foco e interesse:

1. Multipropriedade Imobiliária de Direito Real de Habitação Periódica, que doravante simplesmente denominarei como Multipropriedade IMOBILIÁRIA: Aqui o proprietário usa o imóvel por determinado prazo e por período proporcional ao seu investimento; cada um deles deve responder individualmente, na proporção de sua fração de tempo de uso do imóvel, pelo pagamento dos tributos, contribuições condominiais e outros encargos incidentes sobre o imóvel, sem solidariedade entre os diversos multiproprietários.

2. Acionária ou societária: uma sociedade é proprietária do imóvel e emite ações ordinárias que representam a propriedade de frações do imóvel. A sociedade garante a gestão social do imóvel e dão direito de uso;

3. Imobiliária ou complexo de lazer: cada um dos multiproprietários obtêm uma cota ideal, com uso definido com relação ao tempo;

4. Hoteleira: a disponibilidade de tempo é proporcional ao investimento realizado, com possibilidade de locação do tempo de direito.

A Multipropriedade Imobiliária será negócio seguro e lucrativo com a sanção da Lei que regulamenta esta relação jurídica, tendo como base legal de propriedade a escritura registrada em cartório de imóveis, que garante todas as vantagens de um imóvel comum por um valor acessível. A diferença fundamental com o timeshare é que o comprador da multipropriedade imobiliária tem a escritura do imóvel proporcional ao seu tempo de ocupação.

Significa dizer que sua propriedade pode ser vendida, emprestada, alugada ou herdada por vontade e direito seu, como qualquer outro imóvel.

Certamente uma forte tendência para os tempos atuais de crise, em que as pessoas não dispõem de dinheiro sobrando para investir em uma casa de praia ou em uma casa no campo.

Com a aprovação do Projeto de Lei que tramita na Câmara dos Deputados (já tramitou no Senado), que pese algumas lacunas existentes e solucionáveis, toma forma e ocupará os espaços deixados pelas custosas propriedades individuais de pouco uso.

Além de democratizar o acesso a bens imóves e móveis, beneficiando pessoas que não teriam meios econômicos ou interesse em comprar e assumir a manutenção integral de um imóvel para fins de lazer, o compartilhamento de um imóvel para uso temporário ajudaria a reduzir a ociosidade em sua ocupação, e geraria, com isso, maior segurança do próprio bem, mais empregos e mais renda para a comunidade local.

Imagine se, em lugar de ser dono de apenas um imóvel de férias, você seja proprietário de muitos outros, não precisando limitar-se a apenas um único destino. Opção, também para isso, são os serviços da RCI ou da Interval (grupos internacionais que atuam no mundo inteiro e conectam donos de multipropriedades nos principais destinos do planeta). Claro que poderá haver uma diferença a ser paga, de acordo com o destino e com o imóvel. Só A RCI conta com 4.300 empreendimentos afiliados em mais de 100 países.

Mas como fica esta nova relação jurídica no que tange à legislação existente? O projeto de Lei tenta esmiuçar esta relação de forma a dar-lhe a maior segurança jurídica possível. Que pese alguns pontos ainda carecerem de respostas, vamos tentar esclarecê-los ou enfatizar a necessidade de que assim o façam.

Ainda que seja uma propriedade fracionada por período de tempo, a multipropriedade imobiliária é uma relação condomínial, porconseguinte regulada pelos artigos 1314 e posteriores do Código Civil.

Assim temos, por exemplo, que o direito de preferência para a locação, presente na parte final do artigo 1.323 do CC, dispõe que: “resolvendo alugá-la, preferir-se-á, em condições iguais, o condômino ao que não o é”. Claro está que essa preferência só existirá quando houver interesse dos condôminos da multipropriedade imobiliária em alugar para terceiros, alheios ao condomínio.

Já na alienação da fração de tempo da multipropriedade imobiliária, como se observa no PLS 54/2017, art. 1.358-I, III - “alienar a fração de tempo, por ato entre vivos ou por causa de morte, a título oneroso ou gratuito, ou onerá-la, devendo a alienação e a qualificação do sucessor, ou a oneração, ser informadas ao administrador;” PL agora em tramitação na Câmara, não há referência sobre o direito de preferência mas consta do art. 504 do Código Civil que obriga o vendedor da sua fração a terceiros, comunicar previamente todos os demais condôminos, refletindo as condições da oferta de venda.

Outro ponto a esclarecer é quanto à sucessão por conta de herança, no que tange à obrigação de aderir aos regulamentos e condições de uso da fração do imóvel por um estranho ao condomínio indivisivel.

A solução, ao meu ver, seria uma convenção condominial, a exemplo de contratos empresariais de sociedade, com cláusula que obrigasse aos condôminos sobreviventes venderem ou adquirirem as frações do de cujus, priorizando a primeira ou realizando a segunda no insucesso daquela e pelas mesmas condições, em seguida depositando judicialmente, ao sucessor estranho, seu quinhão convertido em moeda corrente.

Quando a concepção da multipropriedade imobiliária se der através da incorporação imobiliária, com a convenção de condomínio edilício registrada no competente Ofício de Registro de Imóveis e averbada junto à matrícula de cada unidade autônoma, conferindo-lhe caráter erga omnes, esta será respeitada por todos os condôminos atuais ou futuros do empreendimento, seja ele originário, sucessor ou adquirente.

Importante ressaltar as diferenças de conceitos existentes entre TIMESHARE e MULTIPROPRIEDADE (tabela comparativa a seguir) para que os leitores não sintam as dificuldades que o público em geral apresenta. Vale também, aproveitando o ensejo, considerarmos os aspectos mais subjetivos, aqueles que o mercado imobiliário costuma incluir em suas análises de viabilidade e de oferta e procura, tudo voltado a um determinado público alvo.

Isto posto, sempre na esperança de ter sido suficientemente elucidativo ao tema, vamos ao texto propriamente dito do Projeto de Lei para comentar, construtivamente, possíveis melhorias, conflitos ou equívocos que ali encontrarmos:

SENADO FEDERAL

TEXTO FINAL

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 54, DE 2017

Altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei dos Registros Públicos), para dispor sobre o regime jurídico da multipropriedade e seu registro.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º O Título III do Livro III da Parte Especial da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo VII-A:

CAPÍTULO VII-A

DO CONDOMÍNIO EM MULTIPROPRIEDADE

Seção I Disposições Gerais

Art. 1.358-B. A multipropriedade reger-se-á pelo disposto neste Capítulo e, de forma supletiva e subsidiária, pelas demais disposições desta Lei e pelas disposições da Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964 (sôbre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias), e da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor).

Art. 1.358-C. Multipropriedade é o regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada.

Parágrafo único. A multipropriedade não se extinguirá automaticamente se todas as frações de tempo forem do mesmo multiproprietário.

Como regime de condomínio que é, suas regras, normas e procedimentos devem estar todos muito bem documentados e registrados para se poder opor, a quem quer que seja, suas normas e princípios.

Pode ser o condomínio dentro de outro condomínio, ou não. Um mede a propriedade por fração de tempo de uso de cada proprietário, o outro mede a mesma propriedade pela fração ideal a que corresponde do total.

O multiproprietário terá que cumprir as determinações da convenção condominial da unidade autônoma e a convenção condominial onde se insere. Certamente a primeira não poderá contrariar a segunda à qual se submete.

Disto decorre a necessidade de usar como base para a convenção da multipropriedade a convenção de onde ela se insere e aí complementar com as regras específicas de compartilhamento do tempo e outras avenças.

Todos os procedimentos comuns ao condomínio mãe devem ser praticados dentro das normas já consolidadas.

IMPORTANTE: A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que a multipropriedade imobiliária tem natureza jurídica de direito real e, no caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento (time-sharing), o coproprietário pode se valer de embargos de terceiro para proteger sua fração ideal. O TJSP havia negado o pedido sob o fundamento de que a cessão de direitos referente aos 2/52 da casa não corresponderia a direito real de propriedade, mas a direito obrigacional, “uma vez que o imóvel foi registrado em nome da devedora, que figurou como centralizadora do contrato e organizadora da utilização periódica do bem”.

Art. 1.358-D. O imóvel objeto da multipropriedade:

– é indivisível, não se sujeitando a ação de divisão ou de extinção de condomínio;

Sua indivisibilidade é corroborada pelo parágrafo único do artigo 1º, possibilitando que um único proprietário possua 100% das frações de tempo que a unidade se submeteu originariamente. Possível então seria, contrário senso, que um único proprietário pudesse reunificar as taxas e os impostos outrora individualizados por fração de tempo.

Exemplo é do proprietário de alguma fração de tempo que resolve não mais participar desta sistemática e consegue comprar a totalidade das frações de tempo. Neste particular, por falta de previsão legal, não existe o direito de preferência para os demais proprietários o que dificultaria sobremaneira tal intento.

– inclui as instalações, os equipamentos e o mobiliário destinados a seu uso e gozo.

Art. 1.358-E. Cada fração de tempo é indivisível.

§ 1º O período correspondente a cada fração de tempo será de, no mínimo, 7 (sete) dias, seguidos ou intercalados, e poderá ser:

– fixo e determinado, no mesmo período de cada ano;

– flutuante, caso em que a determinação do período será realizada de forma periódica, mediante procedimento objetivo que respeite, em relação a todos os multiproprietários, o princípio da isonomia, devendo ser previamente divulgado; ou

O princípio da isonomia só poderá ser alcançado mediante um sorteio presencial e transparente dos períodos. Isso pode vir a ser ser um entrave àqueles que, assalariados, tem o período de férias definido pelas empresas onde trabalham. Neste particular pode haver negociação e troca de períodos com outro proprietário, desde que a convenção assim permita.

– misto, combinando os sistemas fixo e flutuante.

Acredito que esta sistemática seria bem mais facilmente implantada, administrada e aceita se:

1) Contivesse no máximo 17 proprietários. Isto equivaleria a 20 dias por ano para cada proprietário, com um intervalo de 01 dia entre cada período de 20 dias para uma faxina geral e de 8 dias por ano para manutenções preventivas, benfeitorias necessárias ou voluptuárias, sempre contados em dias corridos intermitentes em baixa temporada; ou

2) Contivesse no mínimo 11 proprietários. Isto equivaleria a 30 dias por ano para cada proprietário, com um intervalo de 01 dia entre cada período de 30 dias, para uma faxina geral, e de 24 dias por ano ou 8 dias 3 vezes por ano, para manutenções preventivas, benfeitorias necessárias ou voluptuárias, sempre contados em dias corridos intermitentes em baixa temporada.

§ 2º Todos os multiproprietários terão direito a uma mesma quantidade mínima de dias seguidos durante o ano, podendo haver a aquisição de frações maiores que a mínima, com o correspondente direito ao uso por períodos também maiores.

O direito a voto em assembléia não deve ser equivalente ao número de frações adquiridas por um único proprietário, evitando a supremacia deste sobre os demais em assuntos que afetem a propriedade de todos os condôminos. Ou seja, cada titular será responsável por um voto, de igual valor, mesmo que tenha várias frações adquiridas do mesmo imóvel.

Seção II

Da Instituição da Multipropriedade

Art. 1.358-F. Institui-se a multipropriedade por ato entre vivos ou testamento, registrado no competente cartório de registro de imóveis, devendo constar daquele ato a duração dos períodos correspondentes a cada fração de tempo.

Os herdeiros poderão ser pessoas até então estranhas ao condomínio da multipropriedade constituída e ter dificultada a aceitação das convenções. Estes casos podem dificultar um pouco esta relação jurídica caso não tenha o imóvel sido incorporado com este intuito, tendo sua convenção registrada na matrícula. No caso da venda da fração o problema é menor já que se o interessado não assinar termo de compromisso, obrigatório a todos, com os regramentos existentes, tornaria nulo o contrato de venda e compra por força de exigência da própria convenção originária.

Art. 1.358-G. Além das cláusulas que os multiproprietários houverem por bem estipular, a convenção de condomínio em multipropriedade determinará:

– os poderes e deveres dos multiproprietários, especialmente em matéria de instalações, equipamentos e mobiliário do imóvel, de manutenção ordinária e extraordinária, de conservação e limpeza e de pagamento da contribuição condominial;

– o número máximo de pessoas que podem ocupar simultaneamente o imóvel no período correspondente a cada fração de tempo;

Isso é importantíssimo de ser respeitado visto que alguns poderão querer superlotar o imóvel trazendo problemas para com o condomínio mãe e seus condôminos.

– as regras de acesso do administrador condominial ao imóvel para cumprimento do dever de manutenção, conservação e limpeza;

A figura do administrador condominial deveria poder ser suprida por um dos proprietários ou por um administrador profissional especializado na área, especialmente contratado para este fim.

– a criação de fundo de reserva para reposição e manutenção dos equipamentos, instalações e mobiliário;

– o regime aplicável em caso de perda ou destruição parcial ou total do imóvel, inclusive para efeitos de participação no risco ou no valor do seguro, da indenização ou da parte restante;

– as multas aplicáveis ao multiproprietário nas hipóteses de descumprimento de deveres.

Art. 1.358-H. O instrumento de instituição da multipropriedade ou a convenção de condomínio em multipropriedade poderá estabelecer o limite máximo de frações de tempo no mesmo imóvel que poderão ser detidas pela mesma pessoa natural ou jurídica.

Como comentado anteriormente, a cada proprietário, independentemente do número de frações que possua, deveria corresponder a um único voto.

Parágrafo único. Em caso de instituição da multipropriedade para posterior venda das frações de tempo a terceiros, o atendimento a eventual limite de frações de tempo por titular estabelecido no instrumento de instituição será obrigatório somente após a venda das frações.

Seção III

Dos Direitos e das Obrigações do Multiproprietário

Art. 1.358-I. São direitos do multiproprietário, além daqueles previstos no instrumento de instituição e na convenção de condomínio em multipropriedade:

– usar e gozar, durante o período correspondente a sua fração de tempo, do imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário;

– ceder a fração de tempo em locação ou comodato;

Desde que fique responsável, solidariamente, à quem cedeu, locou ou comandatou.

– alienar a fração de tempo, por ato entre vivos ou por causa de morte, a título oneroso ou gratuito, ou onerá-la, devendo a alienação e a qualificação do sucessor, ou a oneração, ser informadas ao administrador;

Aqui entra a observação de que deveria haver a obrigatoriedade de prioridade de aquisição para os demais proprietários, por condição idêntica à oferecida no mercado.

– participar e votar, pessoalmente ou por intermédio de representante ou procurador, desde que esteja quite com as obrigações condominiais:

- em assembleia geral do condomínio em multipropriedade, sendo que o voto do multiproprietário corresponderá à quota de sua fração de tempo no imóvel;

Não me parece claro que um proprietário, mesmo com mais de uma fração, teria direito a apenas um voto e não tantos votos quantas forem suas frações. Isto é comumente fonte de conflitos, manobras políticas e controvérsias jurídicas que poderiam ser sanadas também na convenção.

- em assembleia geral do condomínio edilício, quando for o caso, sendo que o voto do multiproprietário corresponderá à quota de sua fração de tempo em relação à quota de poder político atribuído à unidade autônoma na respectiva convenção de condomínio edilício.

Imaginem uma assembléia contabilizando votos, em um condomínio de 100 unidades com 17 condôminos cada unidade? Seriam contabilizados 1700 votos. Muito mais plausível seria outorgar a um dos proprietário ou ao administrador que votasse pelos demais, mediante determinações anteriormente impostas pelos demais proprietários daquela unidade conforme assuntos a serem votados.

Art. 1.358-J. São obrigações do multiproprietário, além daquelas previstas no instrumento de instituição e na convenção de condomínio em multipropriedade:

– pagar a contribuição condominial do condomínio em multipropriedade e, quando for o caso, do condomínio edilício, ainda que renuncie ao uso e gozo, total ou parcial, do imóvel, das áreas comuns ou das respectivas instalações, equipamentos e mobiliário;

– responder por danos causados ao imóvel, às instalações, aos equipamentos e ao mobiliário por si, por qualquer de seus acompanhantes, convidados ou prepostos ou por pessoas por ele autorizadas;

– comunicar imediatamente ao administrador os defeitos, avarias e vícios no imóvel dos quais tiver ciência durante a utilização;

A não comunicação implicará em responsabilização deste quando da entrada do próximo.

– não modificar, alterar ou substituir o mobiliário, os equipamentos e as instalações do imóvel;

– manter o imóvel em estado de conservação e limpeza condizente com os fins a que se destina e com a natureza da respectiva construção;

– usar o imóvel, incluindo suas instalações, equipamentos e mobiliário, conforme seu destino e natureza;

– usar o imóvel exclusivamente durante o período correspondente a sua fração de tempo;

– desocupar o imóvel, impreterivelmente, até o dia e hora fixados no instrumento de instituição ou na convenção de condomínio em multipropriedade, sob pena de multa diária, conforme convencionado no instrumento pertinente;

– permitir a realização de obras ou reparos urgentes.

§ 1º Conforme previsão que deverá constar da respectiva convenção de condomínio em multipropriedade, o multiproprietário estará sujeito:

– no caso de descumprimento de qualquer de seus deveres, a multa;

– no caso de descumprimento reiterado de deveres, a multa progressiva e à perda temporária do direito de utilização do imóvel no período correspondente a sua fração de tempo.

Não definir o que é um reiterado descumprimento de deveres é fonte grave de conflitos. Esse é um parâmetro a ser muito bem explicitado pelos condôminos uma vez que eles podem ter que responder pelo uso que fizerem de suas frações ou pelo uso de quem estes autorizaram.

§ 2º A responsabilidade pelas despesas referentes a reparos no imóvel, incluindo suas instalações, equipamentos e mobiliário:

– quando decorrentes do uso normal e do desgaste natural do imóvel, será de todos os multiproprietários;

– quando decorrentes de uso anormal do imóvel, será exclusivamente do multiproprietário responsável pelo uso anormal, sem prejuízo de multa.

§ 3º Os multiproprietários responderão, na proporção de sua fração de tempo, pelo pagamento dos tributos, contribuições condominiais e outros encargos que incidam sobre o imóvel.

§ 4º A cobrança das obrigações de que trata o § 3º será realizada mediante documentos específicos e individualizados para cada multiproprietário.

§ 5º Cada multiproprietário de uma fração de tempo responde individualmente pelo custeio das obrigações, não havendo solidariedade entre os diversos multiproprietários.

Art. 1.358-K. Para os efeitos do disposto nesta Seção, são equiparados aos multiproprietários os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos a cada fração de tempo.

Seção IV

Da Transferência da Multipropriedade

Art. 1.358-L. A transferência do direito de multipropriedade e a sua produção de efeitos perante terceiros dar-se-ão na forma da lei civil e não dependerão da anuência ou cientificação dos demais multiproprietários.

Mais uma vez a falta de previsão do direito de preferência para alienação ou locação da fração de tempo aos demais proprietários é provável fonte de conflitos, na medida que coloca um estranho nesta relação condominial, sem chance dos demais evitarem tal situação.

§ 1º Não haverá direito de preferência na alienação de fração de tempo, salvo se estabelecido no instrumento de instituição ou na convenção do condomínio em multipropriedade em favor dos demais multiproprietários ou do instituidor do condomínio em multipropriedade.

Reputo importantíssimo este parágrafo ao disponibilizar esta opção.

§ 2º O adquirente será solidariamente responsável com o alienante pelas obrigações de que trata o § 5º do art. 1.358-J caso não obtenha a declaração de inexistência de débitos referente à fração de tempo no momento de sua aquisição.

Seção V

Da Administração da Multipropriedade

Art. 1.358-M. A administração do imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário será de responsabilidade da pessoa indicada no instrumento de instituição ou na convenção de condomínio em multipropriedade, ou, na falta de indicação, de pessoa escolhida em assembleia geral dos condôminos.

§ 1º O administrador exercerá, além daquelas previstas no instrumento de instituição e na convenção de condomínio em multipropriedade, as seguintes atribuições:

I coordenação da utilização do imóvel pelos multiproprietários durante o período correspondente a suas respectivas frações de tempo;

II determinação, no caso dos sistemas flutuante ou misto, dos períodos concretos de uso e gozo exclusivos de cada multiproprietário em cada ano;

III manutenção, conservação e limpeza do imóvel;

IV troca ou substituição de instalações, equipamentos ou mobiliário, incluindo:

· determinar a necessidade da troca ou substituição;

· providenciar os orçamentos necessários para a troca ou substituição;

· submeter os orçamentos à aprovação pela maioria simples dos condôminos em assembleia;

· elaboração do orçamento anual, com previsão das receitas e despesas;

· cobrança das quotas de custeio de responsabilidade dos multiproprietários;

· pagamento, por conta do condomínio edilício ou voluntário, com os fundos comuns arrecadados, de todas as despesas comuns.

§ 2º A convenção de condomínio em multipropriedade poderá regrar de forma diversa a atribuição prevista no inciso IV do § 1º.

Art. 1.358-N. O instrumento de instituição poderá prever fração de tempo destinada à realização, no imóvel e em suas instalações, em seus equipamentos e em seu mobiliário, de reparos indispensáveis ao exercício normal do direito de multipropriedade.

§ 1º A fração de tempo de que trata o caput poderá ser atribuída:

I – ao instituidor da multipropriedade; ou

II – aos multiproprietários, proporcionalmente às respectivas frações.

§ 2º Em caso de emergência, os reparos de que trata o caput poderão ser feitos durante o período correspondente à fração de tempo de um dos multiproprietários.

Seção VI

Disposições Específicas Relativas às Unidades Autônomas de Condomínios Edilícios

Art. 1.358-O. O condomínio edilício poderá adotar o regime de multipropriedade em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas, mediante:

I - previsão no instrumento de instituição; ou

II - deliberação da maioria absoluta dos condôminos.

Parágrafo único. No caso previsto no inciso I do caput, a iniciativa e a responsabilidade para a instituição do regime da multipropriedade serão atribuídas às mesmas pessoas e observarão os mesmos requisitos indicados nas alíneas “a”, “b” e “c” e no § 1º do art. 31 da Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964.

Art. 1.358-P. Na hipótese do art. 1.358-O, a convenção de condomínio edilício deve prever, além das matérias elencadas nos arts. 1.332, 1.334 e, se for o caso, 1.358-G:

– a identificação das unidades sujeitas ao regime da multipropriedade, no caso de empreendimentos mistos;

– a indicação da duração das frações de tempo de cada unidade autônoma sujeita ao regime da multipropriedade;

– a forma de rateio, entre os multiproprietários de uma mesma unidade autônoma, das contribuições condominiais relativas à unidade, que, salvo se disciplinada de forma diversa no instrumento de instituição ou na convenção de condomínio em multipropriedade, será proporcional à fração de tempo de cada multiproprietário;

  • a especificação das despesas ordinárias, cujo custeio será obrigatório, independentemente do uso e gozo do imóvel e das áreas comuns;

  • os órgãos de administração da multipropriedade;

  • a indicação, se for o caso, de que o empreendimento conta com sistema de administração de intercâmbio, na forma prevista no § 2º do art. 23 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008, seja do período de fruição da fração de tempo, seja do local de fruição, caso em que a responsabilidade e as obrigações da companhia de intercâmbio limitam-se ao contido na documentação de sua contratação;

  • a competência para a imposição de sanções e o respectivo procedimento, especialmente nos casos de mora no cumprimento das obrigações de custeio e nos casos de descumprimento da obrigação de desocupar o imóvel até o dia e hora previstos;

  • o quorum exigido para a deliberação de adjudicação da fração de tempo na hipótese de inadimplemento do respectivo multiproprietário;

  • o quorum exigido para a deliberação de alienação, pelo condomínio edilício, da fração de tempo adjudicada em virtude do inadimplemento do respectivo multiproprietário.

Art. 1.358-Q. Na hipótese do art. 1.358-O, o regimento interno do condomínio edilício deve prever:

– os direitos dos multiproprietários sobre as partes comuns do condomínio edilício;

– os direitos e obrigações do administrador, inclusive quanto ao acesso ao imóvel para cumprimento do dever de manutenção, conservação e limpeza;

– as condições e regras para uso das áreas comuns;

– os procedimentos a serem observados para uso e gozo dos imóveis e das instalações, equipamentos e mobiliário destinados ao regime da multipropriedade;

– o número máximo de pessoas que podem ocupar simultaneamente o imóvel no período correspondente a cada fração de tempo;

– as regras de convivência entre os multiproprietários e os ocupantes de unidades autônomas não sujeitas ao regime da multipropriedade, quando se tratar de empreendimentos mistos;

– a forma de contribuição, destinação e gestão do fundo de reserva específico para cada imóvel, para reposição e manutenção dos equipamentos, instalações e mobiliário, sem prejuízo do fundo de reserva do condomínio edilício;

– a possibilidade de realização de assembleias não presenciais, inclusive por meio eletrônico;

– os mecanismos de participação e representação dos titulares;

– o funcionamento do sistema de reserva, os meios de confirmação e os requisitos a serem cumpridos pelo multiproprietário quando não exerça diretamente sua faculdade de uso;

– a descrição dos serviços adicionais, se existentes, e as regras para seu uso e custeio.

Parágrafo único. O regimento interno poderá ser instituído por escritura pública ou por instrumento particular.

Art. 1.358-R. O condomínio edilício em que tenha sido instituído o regime de multipropriedade em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas terá necessariamente um administrador profissional.

§ 1º O prazo de duração do contrato de administração será livremente convencionado.

§ 2º O administrador do condomínio referido no caput será também o administrador de todos os condomínios em multipropriedade de suas unidades autônomas.

Aqui vejo uma irregularidade grave quando a lei obriga aos proprietários de uma unidade multiproprietária que se subordinem a um administrador escolhido pelo próprio condomínio edilício. Se os proprietários quiserem outorgar a responsabilidade para que um destes mesmos proprietários faça as vezes do administrador, inclusive respondendo pela unidade ao administrador geral? Fica a dúvida!

§ 3º O administrador será mandatário legal de todos os multiproprietários, exclusivamente para a realização dos atos de gestão ordinária da multipropriedade, incluindo manutenção, conservação e limpeza do imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário.

§ 4º O administrador poderá modificar o regimento interno no que diga respeito aos aspectos estritamente operacionais da gestão da multipropriedade no condomínio edilício.

Mais uma vez dá-se ao administrador do condomínio edilício a indevida competência operacional para decidir pelos proprietários que, pelo exposto, sequer podem opinar. Isto corresponderia muito mais a um sistema de timeshare do que a um de multipropriedade. Talvez se estes multiproprietários autorizassem que sua unidade fosse mantida num pool de locação, administrado pelo próprio condomínio edilício, isto teria alguma razão de ser no meu mais simples vislumbre. O nexo deste item estaria muito mais claro e adequado ao que expões o parágrafo único do art. 1358-S.

§ 5º O administrador pode ser ou não um prestador de serviços de hospedagem.

Art. 1.358-S. Na hipótese de inadimplemento, por parte do multiproprietário, da obrigação de custeio das despesas ordinárias ou extraordinárias, é cabível, na forma da lei processual civil, a adjudicação, ao condomínio edilício, da fração de tempo correspondente.

Parágrafo único. Na hipótese de o imóvel objeto da multipropriedade ser parte integrante de empreendimento em que haja sistema de locação das frações de tempo no qual os titulares possam ou sejam obrigados a locar suas frações de tempo exclusivamente por meio de uma administração única, repartindo entre si as receitas das locações independentemente da efetiva ocupação de cada unidade autônoma, poderá a convenção do condomínio edilício regrar que em caso de inadimplência:

– o inadimplente fique proibido de utilizar o imóvel até a integral quitação da dívida;

– a fração de tempo do inadimplente passe a integrar o pool da administradora;

– a administradora do sistema de locação fique automaticamente munida de poderes e obrigada a, por conta e ordem do inadimplente, utilizar a integralidade dos valores líquidos a que o inadimplente tiver direito para amortizar suas dívidas condominiais, seja do condomínio edilício, seja do condomínio em multipropriedade, até sua integral quitação, devendo eventual saldo ser imediatamente repassado ao multiproprietário.

Art. 1.358-T. O multiproprietário somente poderá renunciar de forma translativa a seu direito de multipropriedade em favor do condomínio edilício.

A renúncia translativa é termo comumente utilizado no direito sucessório no que tange à herança. Sem entrar neste mérito específico, me parece muito estranho, salvo engano interpretativo, impor ao proprietário de um direito real, no caso a unidade imobiliária, obrigação de renunciar de seu bem, de forma translativa, em favor do condomínio edilício. Me parece um grande absurdo um proprietário, no sentido amplo da palavra, não poder dispor do seu bem como melhor lhe aprouver. Fica a dúvida!

Parágrafo único. A renúncia de que trata o caput só é admitida se o multiproprietário estiver em dia com as contribuições condominiais, com os tributos imobiliários e, se houver, com o foro ou a taxa de ocupação.

Art. 1.358-U. As convenções dos condomínios edilícios, os memoriais de loteamentos e os instrumentos de venda dos lotes em loteamentos urbanos poderão limitar ou impedir a instituição da multipropriedade nos respectivos imóveis, vedação essa que somente poderá ser alterada no mínimo pela maioria absoluta dos condôminos.”

Estes últimos artigos conseguiram, no meu entender, disvirtuar o próprio conceito de propriedade. Deturpam e usurpam os poderes que a norma positivada estabelece para aquele que possui o direito de propriedade.

A Propriedade privada compreende o direito de usar, gozar e dispor de uma determinada coisa, de modo absoluto e exclusivo, sem condicionantes ou interferência de terceiros.

Realmente fiquei em dúvida de qual seria a melhor interpretação a estes dois últimos artigos. Seriam eles resultado de loby econômico que privilegiariam determinada categoria de interessados? Fica a dúvida e a vontade de ver esclarecidas estas questões. O tempo e a experiência certamente nos dirá em breve.

Art. 2º A Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 176. ..............................................................

§ 1º ........................................................................

...............................................................................

II – ........................................................................

...............................................................................

6) tratando-se de imóvel em regime de multipropriedade, a indicação da existência de fichas auxiliares, nos termos do § 10;

...............................................................................

§ 10. Quando o imóvel se destinar ao regime da multipropriedade, além da matrícula do imóvel, haverá uma ficha auxiliar para cada fração de tempo, onde se registrarão e averbarão os atos referentes à respectiva fração de tempo, ressalvado o disposto no § 11.

§ 11. Na hipótese prevista no § 10, cada fração de tempo poderá, em função de legislação tributária municipal, ser objeto de inscrição imobiliária individualizada.

§ 12. Na hipótese prevista no inciso II do § 1º do art. 1.358-N da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), a fração de tempo adicional, destinada à realização de reparos, constará da ficha auxiliar referente à fração de tempo principal de cada multiproprietário, não sendo objeto de ficha auxiliar específica.” (NR)

“Art. 178. ..............................................................

...............................................................................

III – as convenções de condomínio edilício, condomínio geral voluntário e condomínio em multipropriedade;

....................................................................” (NR)

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Finalizando, considerei esta uma Lei bastante interessante, com algumas lacunas a serem preenchidas e uma ou duas obrigações esdrúxulas que mereceriam maior reflexão e explicação.

Ela chega em boa hora, considerando a crise econômica que o pais enfrenta, mas com décadas de atraso. Afinal, não é de hoje que o Brasil sofre crises econômicas profundas.

Tenho a convicção de que este instituto da multipropriedade, principalmente aquelas contidas em condomínios mais flexíveis e modernos, corresponderão às expectativas dos interessados, desde que muito bem assessorados.

A complexidade do tema pode esconder armadilhas importantes e transformar sonhos em pesadelos. Recomenda-se fortemente que todas as etapas de aquisição de uma multipropriedade seja analisada por um especialista, principalmente pela denominação inadequada e confusa das diversas modalidades de participação proprietária de uma unidade imobiliária autônoma.

 
 
 

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